terça-feira, 24 de agosto de 2010

de coeur, cuore, cor, coração...



Faquir involuntário, cascata de champanha, púrpura rosa do Cairo, sapato de sola furada, verso de Mário Quintana, vitrina vazia, navalha afiada, figo maduro, papel crepom, cão uivando pra lua, ruína, simulacro, varinha de incenso. Acesa, aceso - vasto, vivo: meu coração teu.



[caio f. abreu]

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

do imbróglio que quiproquó...

Palavra popular muito usada com o significado de confusão.

Nos tempos antigos, nos quais ainda se ia às "pharmácias", quando os clientes procuravam algum remédio que não estava disponível, o farmacêutico recorria a um livro grosso que relacionava os possíveis substitutos para cada remédio ou substância. Era mais ou menos algo como "este está para aquele". O nome do livro era em latim, como convinha na época às publicações sérias: Quid Pro Quo.

O processo de busca no "Quid Pro Quo" se iniciava com a frustração de uma compra rápida. Era complexo, demorado e ininteligível para os clientes, e se transformava em uma confusão. Inevitavelmente o nome do livro passou a significar qualquer coisa que de simples se degenerasse em confusão. Deu quiprocó?



E disso, bem, fez-se esse nó.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

"Queria ser outra vez ela mesma, recuperar tudo que tivera de ceder em meio século de uma servidão que a fizera feliz, sem dúvida, mas que uma vez morto o marido não deixava a ela nem traços da sua identidade. Era um fantasma numa casa alheia que de um dia para outro se tornara imensa e solitária, e na qual vagava à deriva, perguntando a si mesma angustiada quem estava mais morto: o que tinha morrido ou a que tinha ficado. Não podia afugentar um recôndito sentimento de rancor contra o marido por havê-la deixado só no meio do oceano tenebroso. Tudo que era dele a fazia chorar: o pijama debaixo do travesseiro, os chinelos que sempre lhe pareceram de doente, a recordação de sua imagem se despindo no fundo do espelho enquanto ela se penteava para dormir, o cheiro de sua pele que havia de persistir na dela muito tempo depois da morte. Parava no meio de qualquer coisa que estivesse fazendo e dava um tapinha na própria testa, porque de repente se lembrava de alguma coisa que esquecera de lhe dizer. A cada instante lhe vinham à mente as tantas perguntas cotidianas que só ele podia responder. Certa vez ele dissera algo que ela não podia conceber: os amputados sentem dores, cãibras, cócegas, na perna que não têm mais. Assim se sentia ela sem ele, sentindo que ele estava onde não mais se encontrava."


[amor nos tempos do cólera] Gabriel Garcia Márquez